A exposição
aos ruídos não audíveis pode causar patologias graves à população residente nas
imediações de parques eólicos, concluiu um investigador em questões ambientais.
Em declarações à
agência Lusa, o diretor do Departamento de Saúde Ambiental da Escola Superior
de Tecnologias da Saúde de Coimbra (ESTeSC), João Almeida, defendeu que estes
ruídos devem ser incluídos em estudos de impacte ambiental, o que atualmente
não sucede.
O especialista, autor de um estudo no âmbito de
uma tese de doutoramento intitulado "Risco de exposição a infrassons e
ruído de baixa frequência originados por turbinas eólicas", explicou que,
embora parte do ruído de baixa frequência seja audível pelas pessoas, os
chamados infrassons não o são, nem são exclusivos das turbinas eólicas alvo da
investigação, encontrando-se disseminados em atividades industriais ou de
transportes, como a ferrovia e aeroportos, entre outras.
No caso das turbinas eólicas - existem cerca de
2.800 espalhadas pelo país, em 205 parques eólicos, a maioria na região
interior norte e centro – há "uma preocupação bastante premente", que
decorre da localização "muitas vezes em cima de casas e da inexistência de
legislação destinada a minorar os riscos para a saúde pública aquando da sua
instalação.
Do mal-estar geral e prolongado à tosse e
dificuldade em respirar
Na sua investigação, o também professor da escola
do Instituto Politécnico de Coimbra, identificou duas categorias de
consequências fisiológicas adversas para as populações residentes na
proximidade de parques eólicos, associados à exposição a infrassons e ruído de
baixa frequência: uma mais ligeira, que se caracteriza por mal-estar geral e
prolongado, com dores de cabeça, dificuldade em dormir, falta de concentração
ou irritabilidade, entre outros sintomas; e outra mais grave, com problemas
pulmonares (muita tosse e dificuldade em respirar), apneias, arritmias
cardíacas ou espessamento do pericárdio, a dupla membrana que envolve o
coração.
Por outro lado, há
populações que recebem o impacto dos infrassons "em alturas mais
vulneráveis, que é quando estão a descansar”.
“Passam a noite em casa a dormir e estão sempre expostas, o organismo está sempre a receber estímulos, impulsos de energia sonora e não conseguem descansar convenientemente", acrescentou o especialista da ESTeSC.
João Almeida enfatizou, por outro lado, que os infrassons "têm uma
característica que é um comprimento de onda muito grande e que mesmo que
encontrem barreiras acústicas pelo caminho não são atenuados por essas
barreiras", fazendo com que a 10 quilómetros da fonte emissora "o
nível de pressão sonora apresente uma perda reduzida", o que o torna
"importante na ótica da saúde pública".
Em Portugal, o especialista em saúde ambiental afirmou existir "um
lapso na legislação" dos estudos de impacte ambiental necessários à
instalação de parques eólicos, que não prevê a medição e análise de infrassons,
mas apenas do ruído audível, situação análoga a alguns países europeus.
Noutros, como por exemplo na Rússia, foram estabelecidas regras para a
instalação de parques eólicos, com legislação "que retrata infrassons e a
preocupação relativamente aos infrassons", sustentou.
As determinações, adiantou João Almeida, incluem "a definição de
distâncias de segurança [para as populações] em função da altura da torre, quer
a altura da torre com a pá [da hélice], quer a uma distância fixa”. “Portanto,
há várias regras que se vão adotando em vários países da Europa e em Portugal
não temos [essas] regras", garantiu.
Acresce que os estudos de impacte ambiental elaborados de acordo com a
legislação nacional e referentes aos parques eólicos instalados "retratam
muito o ruído ambiental e o ruído ambiental é o ruído audível".
Nas medições que fez no âmbito do estudo - em três parques eólicos da
região Centro - João Almeida nota que não foram atingidos os valores limite
definidos para o ruído ambiental, mas que este é aferido "com um filtro
que tenta simular aquilo que é a receção no ouvido do recetor".
Já os infrassons, que se geram com a passagem das pás pela turbina, o
chamado ruído aerodinâmico, "devem ser medidos sem filtro, porque é uma
exposição de todo o organismo", defendeu.
João Almeida afirma-se consciente da importância económica e em termos
ambientais para o país dos investimentos em energia eólica, mas advoga a
definição "logo à partida" de distâncias de segurança na instalação
das infraestruturas, com inclusão da medição de infrassons nos estudos de
impacte ambiental como medida protetora da saúde pública.
"É importante que a legislação contemple este tipo de ruídos, para
que o recetor, seja humano seja animal, esteja contemplado e seja protegido",
reforçou.